terça-feira, julho 29, 2008

Faróis e Faroleiros


Uma das vantagens dos idosos é poderem repetir-se sem que daí advenha mal ao mundo.
Pois bem, uma das descobertas na minha longa e variada vida de Marinha, foi a capacidade demonstrada pela generalidade dos profissionais que, sob a designação de faroleiros, representam muito mais do que essa figura mítico-romântica dos salvadores de navios, empoleirados na falésia, garantindo o alumiamento dos equipamentos à sua guarda ou fazendo soar as roncas, rompendo o nevoeiro.
O seu isolamento forçado pela situação inóspita da maioria dos faróis onde prestavam serviço, fez deles tocadores de todos os instrumentos.
Desde pescadores, electricistas, mecânicos, pedreiros, carpinteiros, pintores/caiadores, cozinheiros, marinheiros experimentados na condução de pequenas e médias embarcações, agricultores e até enfermeiros, estes homens, de poucas falas na sua maioria, tinham no gesto e na acção o seu modo de comunicar e viver.
Claro que as tecnologias que entretanto invadiram essa área vieram alterar profundamente o seu modo de estar e de fazer, remetendo-os para funções mais especializadas em locais bem mais cómodos, às vezes bastante longe dos faróis que vigiam e controlam remotamente por processos electrónicos.
Ainda assim, fica-lhes a memória do que já foram e o que ainda representam para os navegadores, que continuam a aferir os seus cálculos e leituras posicionais pela marcação dos faróis, tanto de dia como de noite.
Vem isto a propósito do lançamento pelos CTT duma série de selos alusiva aos faróis portugueses e conjuntamente do livro da autoria do Cte Teixeira de Aguilar, “Faróis – a terra ao mar se anuncia”, que retrata de forma admirável a história e evolução da farolagem em Portugal, com ilustrações soberbas. Um postal ilustrado enviado pelos CTT ao coração dos marinheiros, filatelistas e duma maneira geral a todos os que gostam do mar e de faróis, com a ajuda fundamental do Cte Aguilar.
Falta agora fazer o historial dos faroleiros antes que a sua memória se extinga.

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sábado, julho 26, 2008

O Sismo

Ouvi o seu troar como se alguém bradasse das entranhas da terra, por baixo dos meus pés. Um som cavo e forte como o rachar duma árvore grande antes de tombar ao machado ou à serra mecânica. Depois um tremor que me entrou pelos pés como se estivesse em cima dum respirador do metropolitano na altura da passagem de uma composição, ou num navio que inverte máquinas quando ainda vai com bastante seguimento. Olhei para o tecto e notei uma pequena tremura dos candeeiros.
Depois, um silêncio arrepiante. Foi tudo tão rápido que não deu para reagir, embora me tivesse de imediato apercebido do que se passara.
Disse-lho, mas não acreditou, respondendo-me que deveria ter sido um veículo pesado que passara junto à casa.
Fui lá fora, para me certificar não desse facto mas se teria ficado alguma brecha no terreno, tão forte me parecera o ruído. Felizmente, nada houve de que me tenha apercebido.
Só a ameaça e essa foi severa.
Já ouvira falar, mas nunca tinha ouvido o barulho estranho e ao mesmo tempo aterrador que o sismo produz, próximo do local onde acontece.
Só quer dizer que nunca estivera tão perto do epicentro.
De facto as notícias das vinte confirmaram que terá sido debaixo dos meus pés. Com a magnitude de 3,1 na Escala de Richter.
Concluindo, hoje, cerca das 17H00, pisei um tremor de terra!
E não gostei!

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sexta-feira, julho 25, 2008

O Pêndulo


A retoma da minha actividade jardineira e de apoio ao pomar e vinha, faz com que chegue ao fim do dia estoirado e sem vontade nem jeito para partilhar convosco as minhas preocupações e angústias, bem como aquilo que vai acontecendo à nossa volta susceptível de nos poder influenciar o dia-a-dia.
Estou convencido que devemos ser os maiores produtores de lixo aqui do burgo, sobretudo proveniente das actividades acima descritas.
Não só enchemos diariamente os contentores das redondezas como contribuímos de forma categórica para garantir serviço a uma camioneta que todas as segundas feiras vem carregar os monos e outros lixos que não devem ser metidos nos contentores nem queimados nesta época do ano.
Toda esta actividade vai garantindo também a manutenção da nossa forma física e ocupando um tempo que teima em fugir-nos.
Não sei muito bem durante quanto tempo ainda seremos capazes de manter este ritmo, mas estou em crer que, com algumas mudanças nas técnicas e nos equipamentos, que nos permitam aligeirar o gesto, talvez possamos continuar a deliciar-nos com estes pequenos prazeres de estar mais perto da Natureza e de com ela partilharmos, em harmonia, o pouco tempo que nos for dado viver.
Qual leão-marinho, tenho distribuído o meu tempo entre a terra e o mar, na busca de equilíbrios e temperos e no desvendar dos mistérios que cada um encerra.
O mar sempre me pôs por companhia a saudade dos que deixava e a terra sempre me trouxe uma enorme vontade de ao mar tornar.
Como as marés.
Como um pêndulo.
Cá e lá. De lá para cá.

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quinta-feira, julho 24, 2008

Pressurometria

Hoje estou numa de reinventar palavras já ouvidas mas nunca vistas por escrito, tais como mazarulho, pendericalho, etc.
Isto para dizer que ando com um desses coisos pendurados à bandoleira e outro embrulhado no braço esquerdo, durante 24 horas, para medir a tensão arterial. Um frete do quilé (será kilé?).
A técnica de saúde que me atendeu foi muito atenciosa e disse-me que estava programado para medições de vinte em vinte minutos durante o período diurno e de hora a hora no nocturno.
O problema é que raras são as vezes em que não faz leitura dupla e depois o espaçamento é variável, não tendo atingido nunca os vinte minutos. Já tenho braço inchado.
Se no período nocturno continuar deste modo ou o arranco ou processo o Ministro da Saúde por sevícias praticadas sobre a minha pessoa pelo Serviço Nacional de Saúde. Ainda por cima, esta traquitana não vai permitir que me lave em condições durante vinte e quatro horas, o que, com este calor, só vos digo!
Herdei este emplastro dum padre que o trazia montado e que tive que esperar que o tirasse, que a menina o descarregasse, extraísse o relatório, para só depois eu o poder usar. Uma espécie de cama quente em que ainda por cima temos que levar a ventoínha para a arrefecer. No caso, baterias de 1,5V alcalinas, para recarregar o bicho.
Só espero que o padre não me tenha deixado lá algum vírus que me transforme em filho pródigo.
Uma coisa, fiquei eu a saber pela conversa do dito cujo, enquanto esperava. Que o senhor padre, homem ainda novo, tinha medo de morrer, tal e qual como eu.
Comigo, ainda a coisa é entendível porque não sei bem o que me espera. Mas para ele deveria ser um privilégio poder desfrutar um lugar junto do Criador, tão breve quanto possível.
Mas, em casa de ferreiro, espeto de pau!

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terça-feira, julho 22, 2008

Nós, pecadores...

Recebi por E-mail, mas não resisti a colocar este vídeo neste meu lugar de escape e partilha com os meus amigos e familiares.
Tem a vantagem de não ser da autoria dum português porque corria o risco de, só por esse facto, estar describilizado à partida.
Também não vem pintado com nenhuma cor política, o que não quer dizer que não a tenha, se lha quiserem dar.
Por último, tem a seu favor ter tido origem no país que mais contribui para que tudo o que ali se diz aconteça.
Não diz nada que não saibamos, mas fá-lo duma forma sistematizada e concreta.
É longo, esta versão não está traduzida, mas vale bem a pena!

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segunda-feira, julho 21, 2008

Nós, os jovens pá,...

Nem o calor do Verão evita as diatribes políticas entre os leaders dos principais partidos. Dantes, só se retomava a política depois das férias grandes, com os políticos bronzeados e a cheirarem a cremes de protecção. Chamava-se a isso “a rentrée política”, que normalmente começava com comícios pelos Algarves nos finais de Agosto, para aproveitar ainda os militantes que aí se encontravam de férias, porque os que não gozavam férias ali ou não as gozavam mesmo, esses que comprassem os jornais ou vissem os noticiários.
Só o PC fazia e faz a sua entrada política no princípio de Setembro, com a festa do Avante. Conservadores até nisso.
Mas, voltando aos discursos dos políticos, ao tentarem puxar a juventude para a sua verdade, acabam por envolvê-la na sua mentira, toda ela embrulhada em chavões que nas suas bocas não querem dizer nada, não significam nada.
Uma esquerda moderna e progressista tão perto na acção duma direita anquilosada que nem soluções discursivas encontra para expressar de forma diferente aquilo que a tal de esquerda vai fazendo e que não é mais do que ela própria faria.
Nunca os governantes gritaram que tanto fizeram, de nada se vendo resultados, a não ser os que se conhecem e que os não abonam muito. A pobreza, o desemprego, a falta de perspectivas e agora até de esperança, não servem de cartão de apresentação a qualquer membro deste Governo, nem mesmo das oposições.
A justiça anda pelas ruas da amargura, na verdadeira acepção da expressão, com informação grave transposta para os media sobre a forma de actuação policial em caso de perseguição, etc. Pode e deve ser feito dentro das esquadras e dos quarteis, mas não se pode dar disso conhecimento público aos criminosos. Eles já têm a sua vida tão facilitada pelos actuais Códigos do Processo Penal e Penal!
Depois é a vergonha do caso McCann. Em que ficamos ? Pedimos desculpa também como os jornais britânicos? E o Apito Dourado e a reunião do Conselho de Disciplina da FPF? E a Operação Furacão? E a Quinta da Fonte? E… ? E… ?
Algum poder executivo ou judicial pode vir a público dizer que tudo está bem no Reino da Dinamarca?
Onde estão os resultados ? Onde estão as soluções preconizadas pela oposição com maior peso no eleitorado ?
Onde estão os Portugueses ? Onde está a Juventude ?

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sábado, julho 19, 2008

Resta o Luar


Nem os ralos se ouvem, certamente cozidos pela calorina que se fez sentir ao longo da tarde.
Os milharais são agora o refúgio de tudo o que mexe no Vale do Divor.
O astro esteve sempre dum azul encardido com a poeira levantada pelos espojinhos e pelas aragens desencontradas, do ar quente a subir.
Só os estorninhos se atrevem com este calor, na sua actividade de rapinar tudo o que encontram desprotegido – uvas que começam a pintar, algumas ameixas ou peras serôdias ou que ficaram, os figos ainda em leite. Bichos danados que nem para comer servem, de duros que são.
Lá longe, de vez em quando o latir de algum cão encalorado. A lua faz-se anunciar e prepara-se para cobrir o estrelado do céu e pratear a noite serena, envolvida em odores de restolhos, madressilvas e alfazemas ainda quentes.
Na aldeia, as pessoas puxam bancos e cadeiras quase para o meio da rua, na espreita duma aragem que teima em não aparecer. Hoje vão-se deitar tarde na esperança de que a noite traga alguma frescura. Os deveres matrimoniais terão que esperar pela madrugada ou ficam adiados.
Apesar de ser dia de banho, o suor já repôs o cheiro dos corpos suados e as camisas lavadas já estão empapadas.
Não há como fugir do calor. Com o frio a gente ainda se tapa.
Nem a gente tem apetite. Só se for uma cervejola muito fresquinha, pois que nem o tinto agora sabe bem e o branco faz mal ao colesterol e a mais não sei quê.
Para mim é o que quero. Uma bejeca a estalar, por favor!

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sexta-feira, julho 18, 2008

A Escrita, a cultura e companhia...

Para a gente se aventurar no campo da cultura, mesmo de forma iniciática, tem que ser a tempo inteiro e sem intervalos ou recreios, escolher um modelo ou um mestre e tentar ser proficiente.
Não é compatível com exigências profissionais permanentes redutoras de tempo e flexibilidade mental.
Antes e nos primórdios do século passado, as pessoas com preocupações de ordem cultural organizavam-se em tertúlias ou grupos com afinidade de interesses, aí desenvolvendo as suas pesquisas, reorientando tendências ou ganhando aceitação e não raras vezes o estrelato.
O canudo a pouco e pouco foi ganhando estatuto e criando elites.
Nas escolas do meu tempo era notório o fosso abissal entre classes sociais de origem dos alunos.
A proximidade cultural entre alguns alunos e professores cavava ainda mais o dito fosso, legando para segundo plano todos os que tinham que fazer a ascensão a pulso.
Hoje, as coisas já não se passam exactamente assim mas existe um outro aspecto caracterizador da situação que tem contornos não muito diferentes.
O ensino-aprendizagem assenta muito no livre arbítrio e na capacidade das escolas em meios humanos e materiais para o concretizar. Por outro lado, os alunos têm acesso facilitado a meios áudio visuais e tecnologias que ajudam imenso a interiorizar conceitos e a fazer precocemente escolhas, nem sempre acertadas, que dificultam o papel dos professores ou tutores para uma reorientação atinente às suas necessidades e capacidades.
Embora muito se diga e se grite sobre a ignorância em que hoje se tropeça a todo o instante, em qualquer lado, seria curioso estipular critérios para a definir.
Se bem me lembro, no meu tempo de liceu, éramos obrigados a ler três ou quatro obras clássicas consagradas pelo Estado Novo -
A Morgadinha dos Canaviais de Júlio Dinis, Frei Luís de Sousa de Almeida Garrett, O Auto da Alma de Gil Vicente e Os Lusíadas de Luís de Camões. Para além disso, só os alunos que escolhiam a área de letras tinham oportunidade de aceder a outros autores e obras.
As leituras hoje obrigatórias e recomendadas são muitas mais e de autores variados no tempo e no estilo, passando por Camões, Eça, Pessoa e Saramago.
Não existe aparentemente razão para que se diga que no nosso tempo é que era bom, só porque dávamos menos erros de escrita. Diria que não ousávamos dar erros de escrita para não nos tornarmos exímios na arte de apanhar reguadas.
Mas nunca tínhamos ouvido falar em OVNIS, em direitos humanos, em liberdade de expressão, em ideologias políticas, em higiene e saúde alimentar, em controlo de natalidade, em orgasmo feminino, em interrupção voluntária da gravidez, para só falar em coisas e situações já existentes.
Hoje, a maioria das pessoas conhece relativamente bem as técnicas para prevenir a gravidez ou as doenças sexualmente transmitidas, nelas incluída a SIDA. Já ouviu falar do genoma humano e em organismos geneticamente manipulados e bem assim as guerras que têm dado. Ninguém é alheio aos problemas que o nosso planeta enfrenta e à necessidade de recurso a energias alternativas.
Vai-se mais ao teatro e ao cinema, lê-se bastante mais e escreve-se muitíssimo e muitíssimo bem.
A Internet abriu as portas a todos os que têm vontade e, em muitos casos, vício de transpor para a escrita o que lhe vai na alma e é um espectáculo o que ali se encontra. Para não falar já nos escaparates onde o número de autores de língua portuguesa ocupa lugar de destaque.
A escrita aparece assim como uma voz levada pelo vento a todo o lado. Interventiva ou participativa, perigosa por vezes, mas viva.
No pouco tempo que resta para me fazer ouvir e para me envolver nestas questões de escrita, gostaria muito de lhe poder dar um cunho pessoal que a distinguisse dos demais, mas não consigo. Falta-me a arte e o engenho, mas também e sobretudo a roupagem que a cultura lhe empresta.
Fico-me assim pelo meu galho, embora tentando alcançar o que lhe está acima.
Penso, que por puro exercício físico!

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quinta-feira, julho 17, 2008

O Auto da Festa

03 JULHO 2008

CENDREV: Teatro de rua com música ao vivo

A partir de hoje e até ao dia 26 de Julho, com espectáculos às 22h00, de Terça a Domingo, o CENDREV apresenta o Auto da Festa de Gil Vicente, na Praça 1º de Maio.

A peça inicia-se com um discurso da Verdade, em que esta elogia o teatro e critica a corrupção existente na corte…

Ao pesquisar na Internet as actividades do CENDREV deparei com este anúncio curioso sobre o Auto da Festa de Gil Vicente.
Este Auto escrito cerca de 1528 retrata o ambiente que se vivia neste país à beira-mar plantado naquela época, muito perto da Corte onde o autor se movimentava bem.
O CENDREV no seu anúncio faz questão de espevitar o interesse pela peça, indicando a forma como ela se inicia, com o discurso da Verdade, em que sai elogiado o Teatro e criticada a Corrupção reinante na Corte.
Não terá sido por acaso e a sê-lo, no propósito único de elogiar o Teatro, acabaria igualmente por elogiar a forma como ele sempre soube trazer para a praça pública a Verdade, tantas vezes disfarçada de Mentira.
A farsa, ou tão somente a comédia, sempre usaram a artimanha e o riso para denunciar a torpeza da realidade, que tantas lágrimas nos faz derramar de tormento, de angústia e de infortúnio, neste arrastar de penas que nos consomem o dia a dia.
Ao Gil Vicente e ao CENDREV eu agradeço o relembrar-nos o Discurso da Verdade, nestes tempos de tão impiedosas mentiras no Palco da Rua onde vivemos.

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terça-feira, julho 15, 2008

A festa das sombras...


Tempo de festas, de sol ardente e de orçamentos curtos. Talvez ocorra menor número de incêndios já que os foguetes deverão ser menos porque dinheiro não abunda e, sobretudo, porque não há razão para eles.
De facto, nem cá nem por aí fora, Estados Unidos incluídos, parece haver razões que justifiquem lançar um único foguete. Bem basta os que são lançados diariamente no Iraque, no Afeganistão e em breve no Irão.
Com o etanol e o biodiesel a tirarem pão da boca aos mais necessitados, com a fome a ameaçar as classes médias endividadas, não parece existirem razões para festejos e folguedos.
O Banco de Portugal aconselha o Governo a rever o orçamento em baixa. O que é isso? Quer dizer que ele foi feito em alta? Só se for a alta de preços e de impostos…
Vamos festejar o quê? Só se forem os bons resultados da Banca?! Isto, apesar dos créditos mal parados…
Eu por mim só tenciono festejar o ainda estar vivo! E, mesmo assim, é caso para pensar!

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segunda-feira, julho 14, 2008

A escopeta


No final da época venatória passada, quase ganhei uma doença de nervos, porque o raio da espingarda deu em arranjar uma avaria intermitente, que tão depressa disparava os três tiros seguidos como só dava o primeiro.
Isso impôs-me a necessidade de abater as peças de caça ao primeiro tiro, garantindo desse modo que, mesmo que os outros falhassem, o assunto estava arrumado.
Claro que uma coisa é a gente querer, outra é a gente ser capaz de fazer. Pois bem, calculem o esforço duma empresa destas para um caçarreta do meu calibre, a quem uma metralhadora não seria suficiente para garantir coisa alguma.
Assim que terminou a época, aí fui eu correndo para o armeiro afim de garantir que a próxima não fosse perturbada pela tal dita falha.
Recebi a arma hoje e o armeiro garantiu-me que não é por falta de dar tiros que ficarei a ver a caça passar. Referiu-me ainda, assim como que a atestar a boa prestação da mesma, que quando a foi testar depois de arranjada, não só nunca falhou qualquer tiro como ainda matou uma raposa, que apareceu por acaso.
Coisas, em que é preciso a gente acreditar. Oh, freguês vai um tirinho?

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sábado, julho 12, 2008

O Pulo do Lobo


Encerramento oficial das férias de mar, já que as outras continuam. E para final, julgo que bem pode falar-se em apoteose.
Largámos dos All Garbs rumo a terras transtaganas, por percurso serrano, com passagem por Mértola e paragem em Moreanes, para degustar um almoço de cozido de grão, antecedido dumas fatias dum magnífico presunto de porco preto e dum queijo de Serpa que não lhe ficava atrás. Esta maneira de fazer o cozido é diferente daquela que é uso aqui por estas bandas alentejanas. Ali não leva abóbora nem feijão verde. De qualquer modo estava de encher o bandulho dum abade.
Comemos entre óleos sobre tela, gravuras a tinta-da-china e outras técnicas de pintura, representando obras de pintores variados de que guardo o nome do Malangatana e dum pintor Cubano, Gutierrez.
Não sendo capaz de emitir juízos de valor sobre as obras expostas, resta-me apenas dizer que gostaria de poder ter adquirido duas delas, se a minha capacidade financeira mo permitisse. Mas se assim fora, teria eventualmente escolhido outras noutro espaço qualquer, que mais me agradassem.
Mesmo assim, registo o facto de no fim do mundo e no meio de nenhures, ter encontrado um almoço de quatro estrelas, ornado de obras de arte.
Por indicação do dono do restaurante, fomos em busca de queijaria nas imediações do Pulo do Lobo, onde adquirimos quase dois quilos daquela preciosidade, que de Serpa tem o nome e que só se encontra fora dela, de boa qualidade.
Não resisti, mau grado a hora de “esturrina” a que lá chegámos, a dar uma olhada no Pulo do Lobo que só conhecia de ouvir falar.
De facto é um Guadiana diferente aquele que no Pulo do Lobo se esgueira entre as fragas rasgadas da serrania pela força das águas, ao longo de milénios.
Não sei se as barragens a montante lhe terão alterado o cinzel, mas deu para entender como a Natureza vai moldando a paisagem às suas necessidades e produzindo, também ela, as suas obras de arte.
A chegada fez-se pela tardinha, com muitas águas das pedras bebidas ao longo do extenso e esturricado itinerário escolhido.

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quinta-feira, julho 10, 2008

Verdades com sabor a mentira


De tanto forçar a verdade às vezes estou quase em acreditar na mentira.
Há factos que conhecemos, ou porque vividos ou presenciados, que nos chegam de outras vozes, alterados, enfeitados de pequenas mentiras que não os violentando nem deformando eticamente, lhe atribuem por vezes um peso ou importância que nunca lhes demos.
Na minha vida destemperada de moderação tenho algumas vezes sido protagonista de cenas que não me envergonham, mas de que me não orgulho.
Não tendo sido a primeira vez que isto me acontece, fui recentemente testemunha presencial da citação de uma delas por um amigo de longa data que lhe quis emprestar um sabor que para mim não teve. Feito o reparo, o meu interlocutor fez de mim ancião precoce, incapaz de me lembrar correctamente de factos comigo ocorridos e por ele presenciados, única coisa de que não me lembro de todo.
Mas é assim que as coisas devem ser apresentadas em praça pública, testemunhadas e rubricadas por baixo pelo próprio, sob risco de passar por necessidade de consulta médica por suspeita de Alzheimer

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quarta-feira, julho 09, 2008

Fim de Férias à vista

O Verão retornou com sabor algarvio – quente e pegajoso.
A minha qualidade de sequeiro já começa a enfastiar-se com tanta água.
A rotina já invadiu a minha privacidade não me deixando escapatória. Necessito voltar à rotina anterior para fugir a esta.
A própria leitura que tanto gozo me deu também está a precisar de ir de férias.
No meio disto tudo resta-me a consolação de ter tirado férias de política e de futebol. Não vejo noticiários e apenas faço as palavras cruzadas dos jornais, vejo as horas das marés e o estado do tempo para o dia seguinte.
Nem ao menos existem muitas razões para estar atento na praia, a ver quem passa. É um desfile de misérias.
Acho, no entanto, corajoso a forma como algumas pessoas expõem a sua natureza à apreciação dos outros. Será que se perdeu a noção do equilíbrio e do belo?
Será que já não interessa nada do que se vê? E sobretudo do que se não vê? Como é que as pessoas lidam hoje com a sua própria estética? E com a sua sexualidade?
Claro que já me preocupei mais com este assunto do que me preocupo hoje, mas não deixo de achar que é um aspecto importante da vida das pessoas que julgo está descurado ou mal entendido.
As pessoas têm obrigação, do meu ponto de vista, de se fazerem agradar aos outros, aos que lhe estão próximos e a elas mesmas. São animais sociais. Têm que se procurar e se encontrar e o que vejo mais são atitudes contrárias, de repulsa através de presença física mal cuidada, de comportamentos excessivos e despropositados.
Numa palavra, a cultura do vazio ou, se se quiser, do nu por dentro e por fora.
Perdeu-se o interesse de descobrir, a ternura de partilhar e o encanto de sonhar.
Posso acabar as férias, já!

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segunda-feira, julho 07, 2008

“Alguma coisa vai mal no Reino da Dinamarca”

Há coisas que se não entendem. Hoje fui a Ayamonte, porque havia muito vento e estava mau para banhos.
Não sei há quanto tempo lá não ia mas julgo que o máximo poderá ter sido dois anos.
Pois bem! A diferença é abismal. Novas construções mas, sobretudo, um crescimento ordenado, arruamentos com bordaduras floridas, zonas de estacionamento, informações de trânsito claras e abundantes, zonas exclusivas para trânsito pedonal, a maioria já existente.
Uma terra acolhedora, contrastando brutalmente com V.R. de Sto António, ali do outro lado, onde tudo é feio, desordenado e longe das pessoas.
A crise não parece ali ter chegado. Gente aos montes por tudo quanto é sítio, incluindo portugueses, mas muitos outros estrangeiros.
Consegue ali sobreviver-se a preços mais módicos do que do lado português. Não é uma diferença abissal, mas nota-se.
Uma nota curiosa: o arrumador do parque de estacionamento era, adivinhe-se…português.

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Retorno


Fui atirado para as carteiras do liceu, outra vez, ao reler Virgílio Ferreira. Durante algum tempo foi professor substituto do professor de Português da minha turma, que apareceu mais tarde já com o ano escolar em curso. Talvez por isso não se tenha esforçado muito.
Aulas monótonas, num monólogo interminável, praticamente sem levantar os olhos da secretária. Um ar cansado que o acompanhava sempre como se respirar constituísse, por si só, esforço bastante.
Linguagem hermética e indecifrável para garotos alentejanos do segundo ciclo, com um ligeiro sibilar beirão que o catalogava de galego.
Não sei se alguma vez nos olhou directamente e se fixou algum dos nossos nomes. Julgo que ele odiava simplesmente o ensino, que se lhe impunha como meio de subsistência.
Escritor, naquele tempo, não devia ser suficiente para garantir independência financeira. Ler não era apanágio dos portugueses e obras traduzidas noutros países julgo que não teria ainda.
O sacrifício era mútuo, já que aturá-lo não era simples também.
Manteve-se pelo Liceu de Évora até o seu filho adoptivo, de seu nome Virgílio também, ter acabado o secundário e ter ingressado na Faculdade em Lisboa, para onde se transferiu.
Penso que Évora e o Alentejo lhe carregaram a bagagem de experiências diferenciadas, de que “A Aparição” se dá conta.
Com uma vida literária longa e fecunda, estes contos que agora leio, não deixam de demonstrar a sua faceta de escritor do feio, mas também retratam a postura duma pessoa atenta e preocupada com os problemas sociais do seu tempo.

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domingo, julho 06, 2008

O Engenho e a Arte


Haruki Murakami é de facto uma máquina de criar estórias a partir de qualquer coisa ou mesmo de coisa nenhuma. A simplicidade da escrita e a fluência narrativa fazem de qualquer assunto um motivo de magia.
A frescura do fantástico de mão dada com a torpeza do real. O insólito a par do plausível. Mas sempre, sempre a emoção da leitura, da busca dos limites, a navegação estimada em detrimento da navegação à vista.
Perdendo-se para logo se encontrar, derivando para de seguida se redireccionar, escalando para de pronto descambar, enrolando só pelo prazer de depois desenrolar.
Os títulos são outro prodígio de criatitividade. Envolvem mais do que uma ideia, mais do que um nome ou uma referência. Eles são um propósito, um itinerário mental, às vezes um louco devaneio.
Os contos, mesmo quando escritos na terceira pessoa, ressoam a experiências pessoais aureoladas por uma fantasia derivante.
É uma das minhas preferências em termos de leitura de férias, descontraída, fresca, mágica.

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sexta-feira, julho 04, 2008

Lua Nova e Baixa-Mar


As luas e as marés estão ligadas como a vida e a morte, como o dia e a noite. Umas originam as outras ou sucedem-se inexoravelmente.
A Lua Nova sempre me intimidou. Talvez pelo escuro que carrega consigo, ou simplesmente pela falta de luz que representa. Pelo contrário, a Lua Cheia, a tal dos lobisomens, sempre me encantou, muito provavelmente por oposição à Nova.
Qualquer delas tem efeitos bem visíveis na altura das marés.
Hoje no Baixa-Mar as águas retraíram-se até não sei onde. Pareciam envergonhadas por trazerem carradas de algas verdes, verdadeira salada de alface. Foi possível caminhar sobre a areia molhada resgatada ao fundo do mar durante mais de 50 metros até encontrar a água.
Claro que rapidamente as pessoas se organizaram em “raquetistas”, futebolistas e caminhantes, aproveitando o ensejo.
Mas não há bela sem senão e logo o vento do virar da maré trouxe um toque desagradável, obrigando muita gente a enfarpelar-se ou simplesmente raspar-se antes de apanhar uma pneumonia.
Eu fui uma delas. Não só me vesti como também zarpei logo que pude.
Estou como a lua. Sem luz nem paciência.
Hoje nem as palavras cruzadas saíram.

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Nariz ao Vento


Como um perdigueiro a farejar a caça, encho as narinas no vento carregado de odores das mostardas já secas e de outras herbáceas das marismas, de quando em vez cortado pelos dos pinheiros e abetos plantados para sombrear e proteger o caminho aberto nas dunas para dar passagem aos veraneantes até aos areais da restinga.
É um trajecto que cumpro religiosamente num ritmo a um tempo rápido e biológico, isto é, capaz de garantir actividade cardiovascular acima do normal mas manter a respiração regularizada, com capacidade sobrante para desfrutar do milagre diário da vida entre marés.
Nos esteios, por elas criados, como se fossem artérias e veias, a água leva a humidade a toda uma vegetação que dela precisa, permitindo-lhe sobreviver aos calores do Verão escaldante. Aí se protegem também os alevins das investidas dos predadores até serem capazes de, por si sós, deles escaparem na luta pela sobrevivência.
Neste vaivém das águas, as marismas vão-se livrando dos produtos tóxicos que fabricam e são renovadas de nutrientes que necessitam. Entretanto, a voracidade humana retirou-lhe a maioria dos caranguejos que por ali se viam em profusão, há uns anos atrás, que cavavam galerias onde se escondiam e que serviam também de reserva de água entre marés.
Este sistema vascular não sei quanto tempo mais vai durar. As marés um pouco maiores já quase afogam a vegetação que ficava sempre em seco, apenas com as raízes humedecidas.
A pouco e pouco ou a muito e muito lá vamos cavando a nossa sepultura cultural e arrastando para ela os outros companheiros de infortúnio, que não têm culpa nenhuma das asneiras que vamos fazendo.

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quinta-feira, julho 03, 2008

Branquinhos da Silva


O Sol vai deixando as suas marcas, não só na cor da pele como também na sua textura, enrugando-a, gretando-a, envelhecendo-a mais rapidamente.
No entanto, os corpos tisnados do sol aparentam mais saúde dos que os branqueados pela luz artificial dos escritórios, ou mesmo os pintados em solários de UV’s.
Hoje chegou uma nova fornada de branquinhos da silva, preparados para a assadela anual, como num ritual tribalista.
Os cheiros dos protectores solares empestam o ar que se respira e dizem muito dos seus utilizadores. Consegue perfeitamente distinguir-se um protector ou bronzeador comprado no vendedor de jornais da esquina dos adquiridos nas farmácias ou ainda nos esteticistas ou institutos de beleza.
Tento combater a rotina, mas não consigo de todo fugir às tarefas que me estão confiadas e que fazem deste período que deveria ser de mudança, apenas um período de permuta geográfica temporária.
A temperatura mantém-se óptima dentro e fora de água. Apareceram as algas verdes, que dão a sensação de nos banharmos numa panela caldo verde, só faltando mesmo a rodela de chouriço.
A fugir à rotina apenas a alimentação mais frugal ao almoço e o peixinho fresco ao jantar. Algum exercício mais do que é habitual completa esta ementa de veraneio.

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quarta-feira, julho 02, 2008

Desconsertos e Consertos

A invernia fez estragos no areal da Praia do Barril e duma forma geral em toda a orla marítima da Ilha de Tavira, parte da Ria Formosa. Abriu-lhe brechas que deixam passar a água criando pequenas lagoas no Preia-Mar, que fazem a alegria da pequenada, mas complicam a vida dos adultos, agora cingidos a uma faixa de areia mais estreita e inclinada, que não dá para as futeboladas, as raquetadas e até as passeatas.
Por outro lado a crise económica abriu também brechas no orçamento dos europeus e dos portugueses, em particular, diminuindo a ocupação hoteleira e também o número de pessoas nas praias, nos restaurantes, nos bares. Pode ser apenas a mudança de mês e que as coisas se alterem a partir de 1 de Julho.
No mesmo restaurante, a mesma ementa do ano passado pode custar este ano mais 30 a 40%. São os comerciantes a tentar tirar partido da situação ou corresponde de facto a uma carestia real? Nunca o saberemos.
O tempo está bom. Quente quanto baste, com a água do mar quase à temperatura do corpo. A brisa marítima suave mas refrescante a completar o quadro.
Para quem está “permanentemente em férias”, este período tem tido um sabor de férias reais, um corte quase total com tudo o que era a prática quotidiana.
Tempo para ler, coisa que há já algum tempo não fazia com regularidade. Leituras leves e variadas. As escolhas feitas mais pelos títulos que pelos conteúdos. É o meu processo normal de escolha, a não ser que tenha alguma indicação especial em relação a qualquer obra ou autor. Um dos títulos foi-me particularmente apelativo – “A Árvore das Palavras”.
Tem este período servido também para, duma forma mais sistematizada, praticar alguma actividade física, contrariando a tendência de relaxe em que nos vamos deixando cair com a idade.
Resumindo, estou a reparar alguns dos estragos. Do tempo...claro!

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Análise no Feminino

Se procurasse, dificilmente encontraria duas abordagens do mesmo tema em dois livros de autoras distintas com enquadramentos completamente diferentes, com cargas culturais diversas, com análises em tudo semelhantes.
A temática centra-se nas relações interpessoais homem-mulher, uma montada sobre pura ficção antropológica dos primórdios da Humanidade, a outra retirada da memória e vivência reais, numa época concreta, numa cidade bem identificada.
Ambas derrapam muitas vezes na explicação do inexplicável que em todos nós existe. Pretender padronizar entendimentos e conceitos no feminino ou no masculino é quase tão difícil como saber se o ovo antecedeu a galinha.
Qualquer das tramas suporta bem a temática. A ficção supera em imaginário o que a outra consegue de palpável.
Os encontros e desencontros homem-mulher, são ao fim e ao cabo a essência da vida.
Dessa realidade resulta sempre a mais sublime ou ultrajante ficção. Dessa ficção resulta, certamente, a realidade mais dolorosa ou a mais complacente e altruísta.
Dessa relação nascemos todos nós.

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O Jogo do Sol

Todos os anos é a mesma coisa. Este Verão será o mais quente de todos. Vamos todos torriscar. Os UV estão brutos. Não podemos expor-nos ao sol sob risco de lesões cutâneas graves. Mesmo cancerígenas.
Mas se não for do sol será da sombra. Não existe conserto. As águas e o ar estão inquinados, os alimentos carregados de substâncias tóxicas. Que nos resta?
Tudo em nome das tecnologias, do desenvolvimento, da produtividade, a tal, que nos falta a nós. Pelos vistos ainda bem!
A camada protectora do ozono está furada. Eu pergunto o que não estará?
Com isto tudo, no entanto, a longevidade aumentou! Pois é, mas à custa de quê? De medicamentos, que nos tiram os males dum lado e os põem noutro, retirando-nos a qualidade de vida. Hoje quem poderá dizer que não é toxicodependente, pelo menos a partir duma certa idade?
Ele são remédios para a tensão, ele são medicamentos para a diabetes, ele são drogas para as dores disto ou daquilo.
E o Sol, apesar disto tudo continua a brilhar, como num jogo, a ver quem consegue encandear mais depressa e fazê-lo sair do tabuleiro onde é jogado.
Eu gosto de sol e do Sol, que considero o verdadeiro elixir da vida. Vou querer manter-me em jogo enquanto puder, nem que para isso tenha que tapar sozinho o buraco do ozono…

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