sábado, julho 19, 2008

Resta o Luar


Nem os ralos se ouvem, certamente cozidos pela calorina que se fez sentir ao longo da tarde.
Os milharais são agora o refúgio de tudo o que mexe no Vale do Divor.
O astro esteve sempre dum azul encardido com a poeira levantada pelos espojinhos e pelas aragens desencontradas, do ar quente a subir.
Só os estorninhos se atrevem com este calor, na sua actividade de rapinar tudo o que encontram desprotegido – uvas que começam a pintar, algumas ameixas ou peras serôdias ou que ficaram, os figos ainda em leite. Bichos danados que nem para comer servem, de duros que são.
Lá longe, de vez em quando o latir de algum cão encalorado. A lua faz-se anunciar e prepara-se para cobrir o estrelado do céu e pratear a noite serena, envolvida em odores de restolhos, madressilvas e alfazemas ainda quentes.
Na aldeia, as pessoas puxam bancos e cadeiras quase para o meio da rua, na espreita duma aragem que teima em não aparecer. Hoje vão-se deitar tarde na esperança de que a noite traga alguma frescura. Os deveres matrimoniais terão que esperar pela madrugada ou ficam adiados.
Apesar de ser dia de banho, o suor já repôs o cheiro dos corpos suados e as camisas lavadas já estão empapadas.
Não há como fugir do calor. Com o frio a gente ainda se tapa.
Nem a gente tem apetite. Só se for uma cervejola muito fresquinha, pois que nem o tinto agora sabe bem e o branco faz mal ao colesterol e a mais não sei quê.
Para mim é o que quero. Uma bejeca a estalar, por favor!

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