terça-feira, setembro 02, 2008

Os valores e os números

Greve dos trabalhadores da Soflusa! Há quanto tempo se não ouvia falar ou se não via na TV o anúncio ou a notícia de uma greve neste país?! Porquê? Certamente porque as empresas estão a pagar bons salários aos seus trabalhadores, a proporcionar-lhes prémios de produção e incentivos à sua valorização profissional. Numa palavra, não devem existir razões de protesto nas relações laborais neste jardim à beira-mar plantado. A acreditar nisto, deveria a produção estar a bom nível, a economia florescente , o défice orçamental reduzido drasticamente e a inflação estabilizada em valores aceitáveis. Mas o que acontece não é propriamente isto, mas o inverso. Falências, deslocalizações , desemprego, economia estagnada, inflação instável, aumentos salariais inferiores à carestia de vida, endividamento familiar galopante, crise social alarmante, segurança de pessoas e bens comprometida. Mas, curiosamente, não há notícia de greves. E quando há, são sempre no sector público. Insisto. Porquê? O Estado é mau pagador? Já sabemos que sim! Mas e o sector privado é melhor? Estou em crer que na sua maioria, não! Porque não há greves, então? Porque não existe pessoal sindicalizado, na sua grande maioria com contrato a prazo, incompatível com práticas desta natureza. A bolsa de desemprego com que as empresas contam e jogam é de tal forma, que a exploração laboral estará a níveis nunca antes atingidos. Horários de trabalho, descanso semanal, férias, são argumentos que pesam hoje, como nunca, na manutenção do posto de trabalho. O desrespeito pelos direitos dos trabalhadores envergonharia qualquer governo de antanho. A força dos sindicatos há muito tempo que não estava tão debilitada. O medo do desemprego é hoje maior do que o medo da Pide doutros tempos. O Estado empregador está quase restringido às polícias e aos ministérios. A noção de serviço público está hoje praticamente em desuso com o recurso à compra de serviços a entidades privadas. As Forças Armadas não são hoje opção de vida para alguém que tenha um pouco de respeito por si próprio e pelos juramentos solenes prestados. Defender a Pátria dos seus inimigos será uma obrigação e um dever, mas servir interesses menos claros em jogos de poder a que o País é alheio, parece mais papel para mercenário. Os valores foram substituídos pelos números e os números nunca foram a nossa especialidade.

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