quinta-feira, fevereiro 21, 2008

A Nau Catrineta


O grande timoneiro largou o leme. Já não podia mais com ele.
Cinquenta anos à bolina cerrada, contra ventos e marés, é obra.
Não, que todos os seus gestos tenham sido politicamente correctos, mas conseguiu manter uma insubordinação extremamente incómoda para os seus vizinhos poderosos, politicamente invertebrados, mas implacáveis nas retaliações.
Herança complicada para o seu sucessor.
Quantas tentativas goradas de assalto, esbarrando sempre na teimosia duma guarnição que soube manter-se unida nos momentos cruciais. Mas as brechas vão abrindo. A pouco e pouco o cavername foi ficando à vista. O costado já não segura a estopa e o alcatrão. Perante tormenta tamanha é coisa de milagre ou Neptuno ter aguentado tanto. Mas as balizas e as longarinas vão cedendo. Para água aberta já não falta tudo. O pessoal sobe às enxárceas e clama por terra firme. Já comeram a bolacha capitão e deitaram sola de molho.
O timoneiro, de lábios gretados de tanto bramar, a tez ressequida por mil ressacas, o braço cansado de tanto orçar, aguarda na paz do seu catre, que o arfar da calema lhe indique logradouro justo e finalmente seguro.
- Iça a flâmula marujo. A comissão foi longa e bem sofrida. Merece bem que a todos se mostre como símbolo de resistência e de esperança num mundo mais justo, mais solidário e, sobretudo, mais tolerante para com a vontade das gentes que o habitam.
- Sobe marujo, sobe ao mastro real!

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