quinta-feira, dezembro 27, 2007

Encosta-te a mim

Dantes, era caso para nariz comprido durante não sei quanto tempo. Hoje, a arteriosclerose desculpa. A velhice perdoa. Ataca onde mais nos dói e onde mais sentimos. É velhaca. Traiçoeira. Oportunista.
Hoje aconteceu ou, por outra, talvez acontecesse. Não chegou bem a acontecer porque ela não esperou. Tomou a iniciativa. Dantes, esperaria.
É assim. À medida que o tempo que passamos juntos vai aumentando, vão-se construindo pontes, atirando-nos mutuamente coletes de salvação que nos vão permitindo flutuar sobre as contrariedades da vida ou, tão somente, sobre expectativas goradas. Damo-nos oportunidades, pelo muito que passámos e vencemos juntos.
São cinquenta anos de história comum, com quarenta e três de casados. Tenho dificuldades em delimitar espaços meus e seus porque, de facto, têm maioritariamente sido nossos.
É bom pensar que ao romantismo primaveril, se seguiu o companheirismo outonal, em que bastam pequenos gestos, simples olhares, para que toda uma cumplicidade cimentada e couraçada pela marcha implacável do tempo, nos ponha em harmonia total de pensamento e acção.
Gostaria, tal como Manoel de Oliveira, de abrir um dossier de trabalho para o ano que se aproxima, estabelecendo metas, que se não compadecem com a teimosia do corpo em não lhes querer dar forma.
E a meta é simples e plurianual: acompanhar-mo-nos na tarefa ciclópica de ver os nossos netos tornarem-se mulheres e homens fortes e determinados, na busca do equilíbrio humano, económico e cultural, que lhes permita estar preparados para o futuro, que a eles pertence e que poderão ajudar a moldar com o seu contributo válido, empenhado e solidário.

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