segunda-feira, maio 28, 2007

A Festa do Barro

A Festa Ibérica da Olaria e do Barro, que teve lugar este fim-de-semana em Reguengos de Monsaraz, reuniu artesãos dos dois países, com especial relevo para as olarias de S.Pedro do Corval e de Salvatierra de los Barros.
A recriação das peças antigas usadas nas lides caseiras ou do campo para recolha e transporte de água, confecção de alimentos, assim como outros objectos utilitários e de ornamentação, atingiram níveis muito aceitáveis de fidelidade nos materiais e técnicas genuínas usadas, assim como de imaginação e arte.
As formas e o cheiro do barro levaram-me a um tempo perdido na memória, dos “Paneleiros do Redondo”, como eram designados entre a miudagem os vendedores ambulantes que, para além das loiças e panelas penduradas nas albardas e alforges do burro, vendiam também mel e água-mel.
O seu pregão cantado com aquele acento carregado, que sempre distinguiu os naturais daquela terra alentejana, ainda me enche o ouvido com o seu “ Meliáguaméliiiloiça – arre burro”.
Palmilhavam a cidade de lés a lés com a sua lenga-lenga e a sua arte feita de barros vermelhos ou vidrados.
Longe vão os tempos, em que muita gente mandava gatear os alguidares de barro rachados, pôr varetas nos guarda-chuvas avariados ou amolar as tesouras e facas cegas.
Seria a necessidade que muitas vezes a isso obrigava, mas não havia esta doença maluca do consumismo, que nos faz atirar coisas para o lixo que, com um pouco de paciência (que não existe de todo), poderiam ser reparadas e ainda servir por mais algum tempo.
O desperdício tomou conta das nossas terras, sobretudo das cidades, tudo invadindo, tudo empestando.
A sua recolha e destruição-recuperação é hoje uma operação cara e delicada, que levanta polémicas e opõe governos a autarquias. Ninguém sabe já o que fazer de tanto lixo, de tanta espécie, de tão variadas periculosidades.
A água que recolhíamos e carregávamos em bilhas (quartas, cântaros, enfusas, etc) já só existe na nossa memória.
Hoje, já só pode beber-se de garrafas de plástico descartáveis, mais cara que a gasolina e de origem nem sempre garantida.
Amanhã, corre-se o risco de ter que beber a da chuva, quando e onde cair. Aí, vai ser necessária ou conveniente, no mínimo, uma ânfora de barro para a sua recolha.

Etiquetas: