quinta-feira, abril 24, 2008

Tempos de Abril


Manobra, boletim informativo da Polícia Marítima e Fiscal de Macau, fez o seu aparecimento há, exactamente, 32 anos, dirigido pela, então designada, Comissão de Bem Estar (CBE), órgão representativo eleito que fazia a ponte entre o comando e os comandados. Nele participei com alguns trabalhos de pesquisa regional sobre a droga e as barracas situadas na orla marítima, bem como com alguns traços de pena retratando emoções ou sentimentos. Dalguns desses desmandos, me darei conta neste espaço, recordando coisas que afinal até nem parecem muito distantes, apesar do tempo que sobre elas se derramou.

Transcrição do Boletim Nº13 de Abril de !977 (Ano II) sob o título de abertura “25 de Abril – Portugal Reencontrado”

A capacidade de luta do povo português tem raízes na sua origem como nação, conseguida, a ferro e fogo, contra mouros e castelhanos.
A sua independência, sempre ameaçada e a muito custo conseguida, impôs desde sempre a este povo generoso, sacrifícios de toda a ordem.
O seu espírito empreendedor e aventureiro levou-o a todos os recantos do globo, abrindo ao mundo novas perspectivas, desfazendo mitos e criando novas dimensões físicas e mentais.
Portugal, cobaia de todas as experimentações, aventurar-se-ia no campo da democracia pluralista, fazendo escola na Europa e no Mundo, com a 1ª República.
Só um ano mais tarde a China alcançaria a tão almejada República e só, passados que foram sete anos, a revolução socialista singraria na Rússia.
Toda a Europa bebeu desta experiência e dela beneficiou com excepção do próprio povo português, que tanto por ela lutou.
A 1ª Grande Guerra viria desfechar um golpe fatal nas esperanças promissoras dum país melhor para todos.
Começaria em 1926, um período que haveria de prolongar-se por quase meio século, em que o preço pago pelas experiências havidas, seria o mais doloroso de toda a sua história como nação.
Todas as liberdades individuais e humanas cerceadas, a sua força de trabalho vendida pelo preço que a queriam pagar e finalmente desviada para mercados mais tentadores em França, Alemanha e duma maneira geral toda a Europa.
O abandono das terras pelos emigrantes e soldados fez dos campos de cultura matos e pauis. Substituiu os cantares alegres das desfolhadas e arraiais pelas ladainhas e prantos de dor e saudade. Pôs no coração deste meu povo, o manto cinzento da tristeza e desolação.
As máquinas preferiram os homens na procura da mais valia. As cidades encheram-se de braços caídos, bairros da lata, barrigas vazia e Mercedes de luxo. O obscurantismo toldou vistas e mentes. O copiar ganhou honras de inovação e o bajular foi estandarte e guião. A denúncia conseguiu instalar a insegurança, a desunião e até o ódio no seio das famílias.
O sangue jovem derramado nas guerras coloniais produziu uma hemorragia, talvez mortal neste país, mas teve como única virtude o adubar da terra que produziria os cravos vermelhos do 25 de Abril de 1974. E esses, produziu-os aos milhões, espalhados nas lapelas dos casacos, nos canos das armas, que não mais vomitaram balas e metralha, que não mais semearam a morte.
Onde o ódio reinava, instalou-se um cravo de amor e esperança.
Valeu a pena viver, que mais não fosse, para ter assistido à Primavera renascida naquele Primeiro de Maio de 1974.
Os cravos e sorrisos, as lágrimas de alegria e os abraços, saíram de casa e ocuparam as cidades e os campos.
Os emigrantes vieram. Vieram os desertores duma guerra que consideravam injusta ou de que humanamente tinham medo. Vieram os exilados e os presos políticos, vieram os velhos e os novos, vieram todos e de braço dado trautearam e dançaram músicas e cantares já esquecidos ou ainda nunca ouvidos.
Finalmente, Portugal reencontrado!
O que a seguir fizeram ou estão fazendo os políticos, não sei, nem talvez eles saibam!

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