terça-feira, julho 31, 2007

Alentejano "Vero"

Imagem daqui

Aí está o Verão de que já tinha saudades, mas que já chega, caramba!
Era disto que me lembrava, quando ainda jovem desmiolado, fazia cerca de 5 quilómetros para lá e outros tantos no sentido inverso para ir banhar ao Degebe , no pego da volta, ou ao tanque de rega do albergue dos velhos, nos Canaviais. Foi aí que aprendi a nadar o suficiente para poder concorrer à Marinha.
O tanque não tinha mais do que uns quinze metros de comprimento, com uma altura de água de cerca de um metro.
Ali não morríamos afogados. Poderíamos ter morrido com uma indigestão de alfaiates ou lá como se chamam aqueles bicharocos que patinam sobre as águas estagnadas ou por termos engolido aquilo a que é uso chamar-se baratas de água, que parece terem uns remos em vez de patas e nadam na pastilha, no meio dos limos.
Não podíamos abrir os olhos dentro de água porque, para além de nada vermos a não ser verde, ainda ficávamos com eles vermelhos e com picadas, durante horas.
Salmonelas não sei se já existiam naquele tempo. Mas se existiam, deviam engordar mais do que matar. Tifo, também julgo que ninguém apanhou.
Divertíamo-nos até à hora do regresso, já mais pela fresquinha, aproveitando para mordiscar pelo caminho um cachito de uvas ainda rijas e pouco doces, mas que nos dessedentavam da calma charnequeira.
Às vezes, quando chegava a casa, afogueado, ainda tinha que aturar os sermões da minha mãe ou mesmo experimentar-lhe o peso da mão.
Mas era bom sentir o cheiro dos restolhos recentes crestando ao sol da tarde, à mistura com o das ervas e dos junquilhos bravos nos valados, à beira da estrada. Lá calhava às vezes boleia numa carroça puxada por uma mula ou macho. Mas, as mais das vezes, era o trajecto feito quase a correr sem medo do sol ou do cansaço.
À noitinha juntávamo-nos no passeio de cimento que havia junto à casa onde morava e aí revivíamos as aventuras do dia ou experimentávamos as primeiras passas num cigarrito, às escondidas de familiares e vizinhos.
A temperatura do cimento ainda dava quase para grelhar sardinhas, àquela hora, mas sabia bem senti-la nas pernas descobertas dos calções.
Além de nós, sentavam-se também no passeio os velhos, à busca do ar que lhes faltava nos pulmões, consumidos pelo tabaco e por uma vida de trabalho.
O calor, resultante do aquecimento global ou não, já se fazia sentir naquela época. Com a mesma intensidade com que o tenho sentido nestes últimos dias.
Hoje como ontem, assiste-se à formação de espojinhos, resultantes da subida súbita do ar quente, que arrasta pó e coisas leves, como palhas e ervas secas, num jeito de tornado em miniatura.
Calor forte, seco, alentejano “vero”.

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