sábado, janeiro 06, 2007

Países que cantam

China 1978 – Comuna nos arredores de Cantão. Na visita que nos foi proporcionada, entre outras coisas fomos ver uma escola do ensino básico.
Grande parte da aprendizagem da língua falada é feito por intermédio de canto, onde os alunos apanham as entoações complicadas do Cantonense (na altura, uma das duas línguas oficiais da China) ou do Mandarim (actualmente, língua nacional de ensino obrigatório).
Entrámos numa sala velha, com a caliça a saltar das paredes, com uma daquelas entradas ovais, abertas aos rigores do frio e do calor, apenas decorada com posters de Mao Tse Tung e Chu en Lai. Fazia lembrar a escola onde aprendi as primeiras letras que tinha também penduradas as fotos de Salazar e Carmona primeiro, depois substituída pela do General Craveiro Lopes e mais uma série de quadros na parede com as obras do estado Novo.
Antes do Estado Novo – Depois do Estado novo.
Fomos recebidos com uma canção divinamente entoada pelas vozes afinadas dumas vinte e tal crianças vestidas com cores bizarras para o gosto ocidental, entre os cor de rosa desbotados, verdes alface, vermelhos sangue e azuis ferrete. De faces tisnadas com bochechas gordas avermelhadas, saídas dos cartazes da Revolução Cultural, lá nos brindaram com uma cantiga ou duas.
Depois a professora, com ar saudável de camponesa, fardada a rigor de calças e dolman azul abotoado até ao pescoço, oferecendo um sorriso de orelha a orelha começou por falar com a nossa intérprete. Após alguma discussão em que a nossa anfitriã ainda ficou com as faces mais rosadas, interpelou-nos num inglês perfeito, pelo menos para mim. O espanto de a ouvir falar inglês foi quase tão grande como a interpelação que nos fez no sentido de retribuirmos a amabilidade, cantando uma canção tradicional portuguesa, para a miudagem ouvir.
Aí, ela borrou a pintura definitivamente! Uma cantiga? Que cantiga? Tradicional? Só o Vira! Mas ninguém sabe a letra!
Oh! Caraças! Agora é que ela nos tramou!
Tentámos em vão arranjar uma cantiga, um fado qualquer de que soubéssemos a música e a letra, mas ninguém se lembrava! Uma gaivota voava, voava, mas.….e o resto?
Grândola vila morena… e a seguir?
Até que um de nós qualquer se lembrou – e o hino da bufa?! Eu sei, eu também! Não é que o sabíamos quase todos!
Desculpem mas eu não canto! Nego-me terminantemente a cantá-lo.
Ah e tal, é só uma música, ninguém sabe o que é.
Não, desculpem, eu não canto.
Bom e não cantámos!
Eu, hoje, vão desculpar-me mas também não canto as Janeiras! Nem os Reis! Cheira-me a peditório para a Igreja ou a Natal requentado!
Mesmo que quisesse, também não sabia!

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