sexta-feira, novembro 24, 2006

Viagens salgadas (6)

Mais uma vez na Sagres, agora no caminho de Cabral. Terras de Santa Cruz. Baía de Guanabara, provavelmente onde se situa a cidade mais bonita do mundo. Aí imperavam na altura Wilson Simonal e Seu Jair Rodrigues - Jair de Todos os Sambas. Os alíseos marcaram de novo encontro connosco. Depois de refazer a aguada no Mindelo, lá singrámos para a zona das calmarias, com os olhos atentos nos "paspalhões", que de quando em vez nos punham quase o pano às costas. Toda a gente ansiava por lançar o motor, mas o "velho casmurro" teimava em manter singraduras de duas milhas. Lá descobriu umas bufas tiradas da cartola que nos puseram fora, regressando a velocidades simpáticas que nos deram a oportunidade de gastar dois dias, antes de entrar a Baía de Guanabara, a lavar a cara ao navio. Pranchas no costado e chata na água e lá se pintou o costado e até a linha de água. Depois,a entrada naquela baía de encantar com um vento de feição que nos permitiu largar todo o pano. A embarcação dos pilotos só nos agarrou muito perto do fundeadouro onde inicialmente ficámos. Mais tarde atracámos na Praça Mauá, onde meio Brasil nos visitou. Era a primeira vez que a Sagres voltava ao Brasil com aquele nome. Antes,"se chamava dji Guanabara". Foi uma viagem sofrida, porque morosa e feita em condições que não foram as melhores. O navio foi aprestado um pouco à pressa para estar no Brasil aquando da visita do Chefe do Governo Português (Presidente do Conselho), Prof. Marcelo Caetano em 1969. Havia trabalhos aprazados de mastros e mastaréus que foram apressados, uma andaina nova que não chegou a tempo, uma guarnição pouco treinada. É claro que tempo para treino não faltou durante a viagem. O Director de Instrução dos cadetes da Escola Naval que com connosco realizou esta viagem era e é uma personalidade muito prestigiada na Armada, inteligente e dotada dum sentido de humor extremamente mordaz. Era a primeira vez que embarcava num navio à vela e não perdia uma oportunidade de assistir às manobras de pano do navio. Durante uma delas, o vento não era muito forte e o comandante havia dado ordem para se largar todo o pano. Depois desta manobra estar praticamente concluída, o nosso camarada com o ar de quem nada percebia do assunto e utilizando uma linguagem altamente imprópria em termos marinheirões, perguntou ao comandante se se “enrolasse as pontas” da vela grande o navio não andaria mais. De pronto lhe respondeu o “lobo do mar” que não e que lhe iria de imediato demonstrar isso, tendo dado ordens ao Mestre, para a manobra de ferrar o punho amurado ao vento do “Papa Figos”. Pouco tempo passado e o navio aumentava a sua velocidade em cerca de nó e meio, deixando o comandante um pouco perturbado, sem atinar com resposta para o sucedido. Foi então que o camarada director de instrução comentou, com o seu tom jocoso e mordaz, de que não percebia nada de vela mas sabia umas coisas de cálculo vectorial. E assim navegámos pelas águas turbulentas da convivência institucional, até à “cidadje” maravilhosa. (A continuar)

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