terça-feira, novembro 14, 2006

Viagens salgadas (2)

Esta imagem foi tirada deste site
No final da Escola Naval, fomos fazer tiro às Selvagens na Corte Real, que navegava em companhia da Pacheco Pereira, onde os nossos camaradas AN e EMQ se encontravam embarcados. Viagem cheia de peripécias, em que os observadores de tiro em terra, desembarcados do navio num bote de borracha e comandados pelo então 1ºTen Metzner, um dos primeiros oficiais especializados em Fuzileiro, tiveram que ser abastecidos a partir dum avião saído de Lisboa. O mau tempo obrigou-os a permanecer na ilha muito mais tempo do que inicialmente previsto, não lhes dando hipótese de reembarque. Se bem me lembro, durante os exercícios de tiro com as peças de "127" (Se bem me lembraram), eu dava saltos cada vez que o navio disparava. Era eu e o cão do navio. Não sabíamos onde nos havíamos de meter. Aí decidi que nunca seria artilheiro. Era muito barulhento para o meu gosto. O melhor desta viagem acabou por ser a passagem do ano ao vivo e a cores no Funchal. As festas nos hoteis, o fogo de artifício, os pseudo engates das bifas. Ao fim e ao cabo era sempre o mesmo a safar-se – “Ah! Ganda Stefan!” Na viagem de regresso, na PP, um dos nossos camaradas AN foi mordido num lábio, enquanto dormia, por uma ratazana esfomeada. O navio tinha embarcado em Durban, durante docagem que ali fizera, uma porção muito razoável daqueles passageiros clandestinos, que pareciam cruzados com as vaquinhas holandesas dos nossos amigos Boers. Eram malhados de preto e branco. Durante as refeições a bordo, segundo descrição dos nossos camaradas, sempre que o pessoal da taifa, que servia à mesa, pousava as travessas em cima do móvel de apoio, ainda que momentaneamente, era vulgar ver um dos daqueles parceiros descer pela antepara e vir roubar um naco do que estava a ser servido. Na Corte Real, o flagelo eram as baratinhas navais, que na coberta de vante e no refeitório das praças, onde tomávamos as refeições, partilhavam connosco o repasto. À noite, o pessoal da copa deixava um panelão, dos da sopa, com umas migalhas no fundo em cima duma das mesas do refeitório com uma espécie de ponte da mesa para a panela. De manhã o panelão estava praticamente cheio das nossas pequeninas companheiras de viagem, que eram de seguida postas em cima do fogão, onde crepitavam "bastamente". É por isso que ainda hoje gosto de crocantes. (A continuar)

2 Comments:

Blogger taizinha said...

Que horror! Que nojo! E piolhinhos, não? Isso não porque rapam as cabeças (provavelmente para evitar, pelo menos, esse mal). Bj

15/11/06 08:30  
Blogger JR said...

Na vida é tudo uma questão de hábito. Até nos habituamos a levar pancada. Os ratos a bordo são possivelmente os parceiros mais difíceis de com eles nos habituarmos. Agora as baratinhas navais? O que seria dos navios sem elas? O problema que pode e deve colocar é o da quantidade.Isso sim, naquele tempo haveria um certo desmazelo e falta de meios eficazes para o seu combate.
Para compor o ramalhete e terminar este comentário do comentário, direi que após a chegada a Lisboa os navios foram para desinfestação.Da Pacheco Pereira tiraram qualquer coisa como meia camioneta de ratos mortos e da Corte Real uma quantidade muito apreciável de baratinhas.
BJ

15/11/06 09:53  

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